Manuel Fonseca começou com 16 anos o seu trajeto como treinador ao serviço da Dragon Force do Grijó. No seu percurso, conta ainda com passagens pela Dragon Force no FC Porto e como adjunto dos séniores do Vilanovense FC. Atualmente, com 21 anos, é treinador dos sub-11 de uma das equipas do SC Braga.
Desde Cruyff que o jogo se tornou mais que uma partida
entre 2 equipas. Aprendemos com a turma Catalã, mais recentemente com Pep
Guardiola, que o jogo romântico e posicional torna o jogo mais belo, mais
espetacular ou mais próximo do objetivo: a baliza (ou não). Mas é fundamental que
percebamos o transfer que podemos tirar deste para a formação.
Hoje em dia há uma moda exagerada do jogo a dois toques,
muitas tabelas e rápida reação. Será isso benéfico para todas as equipas? Será
que ao obrigarmos um jogador/equipa a jogar a 1/2 toques estamos a fazer com
que pensem o jogo mais rápido, com que pensem o jogo melhor? Ou ao mesmo tempo
estamos a torná-los previsíveis? “Robôs” fruto da moda Guardiola? Será que
pretendemos uma rápida reação, independentemente de analisarmos a capacidade de
perceção de timing do que o jogo nos dá?
Como treinador há alguns anos, vejo cada vez mais técnicos
pedir as equipas para saírem a jogar curto, como algo inegociável. Como se a
definição de “identidade” dependesse exclusivamente desse momento. Mas é
importante refletir e analisar se este momento representa a ideia toda. Aliás,
o que interessa sair a jogar 5 vezes se acabamos por perder a bola em zonas
“proibidas” e sofremos 5 golos? Será benéfico para os jogadores perder um jogo
porque não poderam ser criativos? Será que estamos a formar? Ou a desformar? Será
que não é importante haver uma união entre todos os momentos de jogo para o
sucesso da equipa?
Para mim, enquanto fã número um das minhas equipas mas principalmente treinador,
tenho de ter a preocupação de dar opções para jogar. Criar dinâmicas para jogar
mais curto, ter opções longas. E isto porque, mais importante do que sair mais
próximo ou mais longo, é sair com qualidade. E se isso pedir um passe de 50
metros, porque não?
Afinal, o que nós queremos não é ter bola? Tal como
referido em cima, vejo demasiada preocupação em “sair a jogar curto”, não
interessando o padrão de problemas do adversário, mas sim o comportamento por nós
“obrigatório”. Fatores que são fundamentais, mas que, muitas vezes são
esquecidos pelas equipas (pelo treinador).
É bastante usual ver equipas que jogam curto serem
pressionadas em cima. O problema não está em arriscar com a saída curta, pelo contrário,
sou apologista que isso pode e deve acontecer. O problema centra-se muitas
vezes na falta de capacidade de análise e treino da equipa. Isto é, não adianta
pedir a uma equipa que saia a jogar se, quando pressionados, não conseguem
diversificar os seus comportamentos, ou seja, não conseguem avaliar o que o
jogo está a dar, esquecendo uma parte do jogo que é fundamental: a
imprevisibilidade.
Isso leva-me para um caminho um pouco mais complexo, o treino.
Jogar curto parece algo muito simples, mas não é. Na minha maneira de ver o
jogo, é um dos momentos mais fascinantes, pois é possível tirar bastantes
ilações duma equipa a partir daí. Conseguimos percecionar a coragem da equipa
(apoiada pelo treinador), movimentações, mas acima de tudo conseguimos ver o
treino; uma associação entre os momentos do jogo num curto espaço de tempo.
Com isto, refiro que tudo é possível com treino, através da
criatividade, mas tendo sempre em atenção o contexto que temos. Dar ferramentas
à equipa para que saiba pensar o jogo e tomar as melhores decisões ao invés de “jogar
por jogar”.
Hoje, este primeiro momento de construção é facilmente contrariado porque é
algo muito programado, muito robótico.
Cada vez mais vemos equipas “chatas”, com pouca diversão no
jogo, poucos jogadores capazes de “rasgar” linhas com fintas que nos prendem à
partida, que nos fazem ser fãs de futebol.
Afinal, o que é o futebol sem espetáculo? É preciso pensar
no treino como algo aquisitivo dentro da complexidade pessoal de cada jogador. É
preciso pensar no treino como um fator fundamental não só no modelo do
treinador, mas, principalmente, no modelo adaptado as características
individuais do atleta. Num jogo de 5x5, com o objetivo de uma equipa jogar a 2
toques, será este exercício benéfico para os atletas? Ou estamos a torná-los
óbvios? A finta também não é uma arma importante para ultrapassar os
adversários? Será que ao “obrigar” uma equipa a ligar com o médio-centro antes de marcar golo é
mostrar à equipa que quero muito jogo interior? Ou que, por outro lado, não
procuro as laterais para criar desequilíbrios ou mesmo atrair, abrindo esse
mesmo espaço interior que pretendo?
Grande parte do processo cognitivo presente num jogo de
futebol é inconsciente. É este que liga o jogador ao jogo em 90%, sendo apenas
10% tratado pela parte consciente do cérebro. Sendo assim, será que conseguimos
criar contextos através do espaço, número de jogadores, que nos levem ao jogo
pretendido sem tirar partes importantes do mesmo? Não será que conseguimos,
através dessas mesmas variáveis, salvaguardar as características individuais
dos jogadores ao mesmo tempo que lhes transmitimos as nossas ideias? Sendo
então a esfera inconsciente a responsável por 90% das ações presentes no jogo,
não deveríamos ter maior atenção a este momento no treino? Por exemplo, se o
espaço é curto ele vai ser “obrigado” a jogar em poucos toques, um jogo mais
apoiado, e não preciso de limitar toques para que esse comportamento apareça.
É fundamental para o treinador refletir e pensar sobre o todo o detalhe porque
só assim estará mais próximo de alcançar o que pretende.
Acredito que este pensamento seja algo confuso pois parece que é “tudo ou nada”,
mas não. Na forma como penso, contemplo e executo o treino (sempre em função do
meu modelo) não retiro do jogo partes importantes como a finta ou o jogo
exterior, tento valorizar o que pretendo dentro dos meus princípios e subprincípios,
dando liberdade de definição, conforme as características de cada jogador, para
os subprincípios.
Atenção, não há uma receita para o sucesso. Isto significa
que, na minha óptica, o treino deve ser pensado e estruturado da forma mais
minuciosa possível. Tentar sempre ir de encontro ao que pretendemos, ao que a
equipa precisa sempre de uma forma “real” ao jogo, próxima da realidade.
Há assim uma ideia que começa a ficar generalizada: Afinal,
quem é o verdadeiro treinador nas equipas? Será o Guardiola ou uma cópia? É fundamental para nós, enquanto treinadores,
analisarmos e retirarmos o que mais nos agrada em cada treinador, em cada
equipa. Isso torna o nosso pensamento mais rico e completo. Mas é importante também
filtrarmos o que realmente importa e que acrescentará no nosso contexto e na
nossa ideia. Porque quando vemos o De Bruyne ou o Bernardo Silva com a bola,
não nos podemos limitar a ver que ele dá “poucos toques”, mas sim a tentar
analisar e refletir o porquê dos 2 toques. Será porque estava com pouco espaço?
Ou será que conseguiu atrair e por isso libertou? Será que vemos um jogador que
está “preso” a 1/2 toques? Ou um jogador com uma compreensão e leitura de jogo
acima da média? São estes aspetos fundamentais que nos fazem evoluir e marcar a
diferença nas nossas equipas. Não só como treinadores, porque todos sonhamos e
trabalhamos para alcançar o êxito, mas também nos nossos jogadores, porque o
jogo é para eles e mais importante do que qualquer outra coisa, é para desfrutarem da partida que disputam.
Em suma, o treino é apaixonante por nos desafiar a cada
momento, por nos prender 24h por dia, por procurarmos uma união perfeita entre
ele, as nossas ideias e os comportamentos no campo. É importante percebermos,
enquanto treinadores que nem sempre o que é feito noutro contexto se enquadra
no meu. Devemos ter curiosidade em pensar no porquê, no quando, no como e
quantas mais perguntas fizermos, mais perto estamos de criarmos as nossas
próprias respostas e consequentemente novas perguntas. É como uma bola de neve,
vamos crescendo e estando cada vez mais perto dos nossos objetivos.
Grande tereinador! Parecia q estava a ler um txto de pacoNassa (preparador fisico expanhol) ou até a ouvir uma das minhas bárras no single "Homem Também Chora". Só uma pergunta pó mister Fonseca, o q penças dos "apoios frontais laterais" (Botelho, C; 2018) das equipas do Tiago Fernandes?
ResponderEliminarPS: Para breve meto aqui uma argumentação mt bala também no blogu. Isto dos testos grandes com nickaname de "Filósofo do Jogo" tem piada, mas quero porporcionar vos as minhas esperiencias na 1ª peççoa.